
Conviver com o Alzheimer é aprender a viver o presente todos os dias. Meu pai, que hoje aos 89 anos, de idade enfrenta essa dura realidade, tem sido meu maior professor sobre tempo, paciência e ressignificação da memória. Como comunicador 50+, enfrento uma jornada que vai muito além das redações, pautas e prazos. É uma rotina de escuta silenciosa, de reencontros com alguém que aos poucos vai se afastando de si mesmo e de mim também.
Há cinco anos perdi minha mãe. E é impossível não lembrar dessa data: 13 de agosto. Ela partiu antes de ver o quanto as coisas mudariam. Antes de assistir à transformação silenciosa que o Alzheimer impõe. Antes de eu entender o quanto o amor precisa ser reinventado todos os dias quando se cuida de alguém que esquece. Antes de conhecer os novos bisnetos
Mas, curiosamente, foi a minha profissão que me ajudou a não me perder no caminho. O jornalismo, com sua sede por compreender, investigar, dar nome às coisas, me empurrou para dentro de livros, artigos médicos e entrevistas com especialistas. A apuração virou estratégia de sobrevivência emocional. Compreender a doença foi minha forma de não me deixar afogar pela dor. E de alguma forma proteger meu pai do desconhecido.
Ainda assim, há momentos lindamente teimosos da memória. Como quando ele me mostra, com brilho nos olhos, os mais de 100 bodoques que ele mesmo fez. Ele corta no quintal pedaços do pé de limão com toda paciência do mundo, molda, amarra, lixa… e guarda. Todas vezes que eu vou lá, ele faz questão de me mostrar sua produção como se fosse a primeira vez. E talvez seja mesmo. Ele ainda se lembra de mim, dos meus irmãos, das histórias antigas. Mas se eu estive com ele hoje, daqui a pouco ele já vai me cobrar dizendo que “tem tempos que não me vê” e que eu deveria aparecer mais. Ele esquece do que comeu no almoço, do café que acabou de tomar, mas não se esquece do amor que sente.
Nesse processo, aprendi que carinho, amor e paciência são os melhores remédios, não só para ele, mas também para mim. Aprendi a estar presente sem exigir coerência. A acolher sem corrigir. A viver no tempo dele, mesmo quando o meu mundo parece acelerar demais. A exercitar a paciência… E ele não deixa que nenhum outro filho corte seu cabelo e faça a barba se não for eu!
E é nesse ritmo mais lento que também vou cuidando de mim. Porque, como comunicador, estou habituado a cuidar das histórias dos outros. Agora, me vejo cuidando da nossa. Mesmo que fragmentada, mesmo que repetida, mesmo que confusa e triste.
Escrevo esse texto não como desabafo, mas como uma partilha. Sei que muitos colegas de profissão, da minha geração, vivem dilemas semelhantes. A gente vai envelhecendo e os nossos pais também. E quando a vida impõe esse tipo de desafio, é preciso se reinventar como filho e como ser humano!
Hoje, o Alzheimer não é só um tema que pesquisei. É uma realidade que vivo. Mas, acima de tudo, é uma oportunidade de exercer o que de mais humano existe em mim: o afeto e a paciência. Acho que herdei de mãe, só pode! E eu nunca achei que ele fosse ter essa doença de tão ativo mentalmente que era. Daquelas pessoas que fazem conta de cabeça na regrinha do noves fora!
E se algum dia eu esquecer quem fui, espero que minha essência, assim como a do meu pai, continue reconhecível no cuidado que ofereci, na paciência que exercitei e no amor que, esse sim, nunca será esquecido! Assim espero!

Robhson Abreu
CEO Grupo PQN
Presidente da Associação dos Blocos de Rua de BH (ABRA BH)
Membro do Conselho Estadual de Turismo de Minas Gerais
Diretor Administrativo da Associação Brasileira dos Jornalistas de Turismo Secção Minas Gerais (Abrajet-MG)
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