
Sou Auditora-Fiscal do Trabalho e, ao longo da minha trajetória, pude presenciar de perto o quanto o trabalho da mulher rural é essencial para o Brasil — e, ao mesmo tempo, o quanto ainda é invisibilizado. No campo, elas produzem, cuidam, administram e sustentam famílias e comunidades inteiras, mas muitas vezes permanecem sem reconhecimento, sem direitos e sem proteção adequada.
Os dados mostram essa contradição com clareza. As mulheres representam cerca de 30% da força de trabalho rural e estão à frente de 20% dos empreendimentos no campo. No entanto, quase metade dessas trabalhadoras não têm vínculo formal de emprego, o que as impede de acessar direitos básicos, como licença-maternidade, aposentadoria e assistência em caso de acidentes. Essa informalidade, somada à desigualdade salarial — que faz com que ganhem em média 20% menos que os homens —, reforça uma lógica de desigualdade histórica que ainda precisamos combater.
Durante fiscalizações realizadas em áreas rurais de Minas Gerais, vimos situações que vão muito além da precarização. Encontramos mulheres trabalhando sem equipamentos de proteção, expostas a agrotóxicos, dormindo em alojamentos improvisados e, em casos extremos, em condições análogas à escravidão. Entre 2003 e 2022, mais de 1.900 mulheres foram resgatadas de situações de trabalho escravo no Brasil — a maioria preta ou parda e com baixa escolaridade. Esses números não são estatísticas frias: representam vidas interrompidas, dignidades feridas e histórias de resistência.
O papel da Delegacia Sindical em Minas Gerais do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho (DS-MG/SINAIT) é justamente dar visibilidade a essas realidades e fortalecer a atuação da fiscalização, garantindo que nenhuma mulher seja privada de seus direitos por estar longe dos centros urbanos. A fiscalização rural, realizada pela Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), é essencial para assegurar condições dignas de trabalho, saúde e segurança — pilares de uma sociedade verdadeiramente justa.
Mas o combate à informalidade e à exploração não depende apenas da atuação fiscal. É preciso que políticas públicas cheguem a essas mulheres. Iniciativas como o Pronaf Mulher, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Selo da Agricultura Familiar – Mulheres Rurais mostram que é possível promover autonomia e inclusão produtiva. Em Minas Gerais, projetos como o Café Feminino de Poço Fundo e o Programa Mulheres e Agroecologia, na Zona da Mata, são exemplos inspiradores de protagonismo e sustentabilidade.
Celebrar o Dia Internacional das Mulheres Rurais, em 15 de outubro, é muito mais do que uma data simbólica. É reconhecer que sem as mulheres, o campo brasileiro não se sustenta. Elas são responsáveis por cerca de 45% da produção de alimentos no país, e sua presença é vital para a segurança alimentar e o desenvolvimento sustentável.
O desafio que temos é garantir que essa força produtiva seja acompanhada de respeito, direitos e voz. A mulher rural não quer ser vista apenas como coadjuvante — ela é protagonista. E o nosso papel, enquanto auditores-fiscais e sociedade, é assegurar que esse protagonismo seja vivido em plenitude, com dignidade e proteção.

Por Alessandra Bambirra Lara, Auditora-Fiscal do Trabalho e filiada à Delegacia Sindical em Minas Gerais do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho (DS-MG/SINAIT)
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