
Poucos autores brasileiros provocaram tanta reverência — e tanto mistério — quanto Dalton Trevisan. Rigoroso, minimalista, obsessivo com a forma e avesso à exposição pública, o escritor construiu uma obra que transformou o conto em laboratório da linguagem e território de inquietação. Agora, em junho de 2025, quando completaria 100 anos, Trevisan é celebrado com a publicação de Os elefantes viriam pela manhã – Treze contos à procura de Dalton Trevisan, organizado pelo jornalista, doutor em Literatura e membro da Academia Mineira de Letras, Rogério Faria Tavares. O lançamento é da Autêntica Editora.
O livro é uma resposta literária à poética de Trevisan: cada conto parte do diálogo com sua obra para tensionar seus temas, estilos e obsessões — e, ao fazer isso, reafirma a vitalidade do conto brasileiro contemporâneo. Como explica o organizador, o volume propõe uma espécie de reescrita coletiva, à maneira do autor curitibano, que reescrevia obsessivamente seus próprios textos ao longo da vida. “Como num palimpsesto, é possível enxergar estas histórias dispostas umas sobre as outras, e todas elas sobre aquelas escritas por Dalton”, escreve Tavares na apresentação.
A coletânea reúne um time de nomes de diferentes gerações e estilos: Noemi Jaffe, Caetano W. Galindo, Carlos Marcelo, Adelaide Ivánova, Cristhiano Aguiar, Luci Collin, Mateus Baldi, Veronica Stigger, Luís Henrique Pellanda, Ana Elisa Ribeiro, Rogério Pereira, Marcelino Freire e João Anzanello Carrascoza.
Os contos percorrem geografias variadas, mas mantêm um elo invisível com o território simbólico de Curitiba, cidade natal de Trevisan. A São Paulo melancólica de Noemi Jaffe, a Recife crua de Adelaide Ivánova e a Campina Grande sombria de Cristhiano Aguiar convivem com a Belo Horizonte de 1947 recriada por Carlos Marcelo.
Curitiba, no entanto, é a espinha dorsal da coletânea: é ali que transita o gateiro de Luís Henrique Pellanda; é onde renascem personagens como Dario e Patachou, de Mateus Baldi; onde a linguagem joyceana de Luci Collin desdobra o cotidiano; e onde se desenrolam os dilemas do “menino magricelo” e da “polaquinha”, revividos por Rogério Pereira.
As tensões entre homens e mulheres aparecem nas encenações de Veronica Stigger e ganham força nas personagens femininas de Ana Elisa Ribeiro, Adelaide Ivánova e Cristhiano Aguiar. Já Marcelino Freire e Caetano W. Galindo prestam tributo direto ao estilo do homenageado: seus contos condensam a síntese, a ironia e a precisão narrativa que marcaram a escrita de Trevisan.
Dalton Trevisan morreu em dezembro de 2024, poucos meses antes do centenário. Discreto até o fim, passou nove décadas quase sem sair da casa onde escreveu boa parte de sua obra — um gesto de silêncio que contrasta com a força explosiva de seus textos. Os elefantes viriam pela manhã honra essa contradição: ao ecoar seus silêncios, amplia a reverberação de sua literatura.

Agenda de lançamentos
Os elefantes viriam pela manhã tem dois eventos de lançamento nesta semana. Na quarta, 2 de junho, Curitiba recebe os autores Caetano Galindo, Luci Collin, Luís Henrique Pellanda e Rogério Pereira, que se encontram para um bate-papo mediado pelo organizador do livro, Rogério Faria Tavares. Será a partir das 19h, na Livraria Arte e Letra (R. Desembargador Motta, 2011, Centro).
Em BH, o convidado será o escritor e jornalista Carlos Marcelo, que se encontra com Rogério Faria Tavares no sábado, 5 de julho, das 11h às 13h, na Livraria Quixote (R. Fernandes Tourinho, 294, Savassi).