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Da Macega à Makaia: pai Ricardo lança seu primeiro livro na Academia Mineira de Letras

Tempo de leitura: 4 min

em 21/10/2025

Da Macega à Makaia: pai Ricardo lança seu primeiro livro na Academia Mineira de Letras


Os conhecimentos tradicionais das casas e territórios de religiões afrobrasileiras, por vezes restritos a quem os frequenta e vive, ganham uma nova plataforma: é o livro “Da Macega à Makaia – abrindo caminhos na tradução do falar negro de terreiro”, proposto por Pai Ricardo de Moura – mestre nas disciplinas de Formação transversal em saberes tradicionais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e coordenador do Centro de Caridade Pai Jacob do Oriente (CCPJO). O projeto foi contemplado no Rumos Itaú Cultural 2023-2024 e será lançado no dia 24 de outubro, sexta-feira, na Academia Mineira de Letras, em Belo Horizonte.

O livro apresenta o ensino, a transcrição, a “escrit(ação)” (termo cunhado por ele) e a editoração dos saberes ancestrais espirituais, artísticos, culturais e éticos herdados de seus antepassados, a fim de resgatá-los, preservá-los e difundi-los. 

Da Macega à Makaiatrata do trânsito entre a oralidade e a escrita do pensamento afro periférico dessa comunidade. “O falar negro é como a macega, uma mata complexa, difícil de atravessar, pela dificuldade que algumas pessoas têm de nos ler, escutar, sentir, entender e ceder espaço”, diz Pai Ricardo que completa: “Já a makaia é o local de mata fértil, de pensamentos e ideias que precisam circular entre espaços distintos. É o bioma, o sistema inteiro, com movimentos, energias, tudo o que está acontecendo nas temporalidades cronológica e da subjetividade. É o lugar que carrega todos os ecossistemas do pensamento negro de terreiro”. 

Filho de Oxóssi – “o deus que habita e é a própria mata” -, Pai Ricardo explica que a makaia e a macega são elementos que sempre estão presentes em suas reflexões. “Para transitar por uma, é preciso passar pela outra. Makaia e macega são caminhos. Para atravessá-los, sugiro um processo criativo compartilhado de transcrição da oralidade, respeitando a cosmologia de terreiro, pautada no diálogo, na coletividade, na transmissão dos conhecimentos, na prática e na escuta atenta entre todos”, conta.

O trabalho foi dividido em eixos, como: “A relação entre os saberes tradicionais e a universidade”; “A cidade, o ambiente e as comunidades tradicionais”; “Territórios de práticas religiosas afro diaspóricas”; “A diáspora negra na periferia”; “Criação e educação no dilema da transmissão de saberes” e “O carretel de sucessão”.

Com esse livro, Pai Ricardo deseja que esses saberes alcancem outras comunidades, redes de povos tradicionais, acadêmicos, gestores e pessoas interessadas em se “engajar na causa” para combater o racismo. “Queremos ser ferramenta e inspiração, termos visibilidade e acessos, e também a tranquilidade de nos comunicarmos em público, nos jornais, na televisão e nos livros a partir de nossos falares e escreveres, de forma mais tranquila e menos vigiada até por nós mesmos”, diz o pesquisador.

O projeto foi desenvolvido de forma coletiva, com a participação da Matuta – Comunidade de Pesquisa em Terreiro, e contou com a coordenação de Nicole Faria Batista. A equipe é formada ainda por Bruni Fernandes (projeto gráfico e editoração), Michelle Araújo Pessoa e Gabriel Ricardo de Moura (pesquisa e produção), Lania Mara Silva, Ana Paula Santos e Alice Bicalho (revisão e capa). Mais que um registro escrito, Da Macega à Makaia é um convite à escuta, à cura e à celebração dos saberes de terreiro — um caminho aberto para que a palavra ancestral encontre novas vozes, e o conhecimento afro-diaspórico continue a ecoar, vivo, nas encruzilhadas da literatura e da vida. O Lançamento de “Da Macega à Makaia: tramas de relação do falar negro de terreiro”, do Pai Ricardo de Moura, é uma iniciativa da AML e tem apoio do Itáu Cultural.

Sobre o autor
Pai Ricardo, como é conhecido, é um zelador – aquele que zela e encaminha o sagrado – da Associação da Resistência Cultural Afro-brasileira Casa de Caridade Pai Jacob do Oriente (CCPJO), terreiro de umbanda de matriz afro-indígena-brasileira fundado em 1966 por seu pai e sua mãe, Joaquim Camilo e Maria das Dores Moura. A Casa, localizada na Lagoinha em BH, realiza rituais, cerimônias, sessões, banhos, atendimentos e festejos, além de atividades como capoeira, artesanato, cultivo de ervas, distribuição de alimentos e promoção do fomento de atividades e expressões culturais afro-brasileiras. Atua também na diretoria do Centro Nacional de Africanidade e Resistência Afro-Brasileira (CENARAB), pela sua importante atuação na preservação e transmissão da riqueza de saberes e fazeres relativos à ancestralidade africana no Brasil e por seu inestimável conhecimento no campo da História e da Cultura Afro-Brasileira e Africana, cujo ensino foi tornado obrigatório pela Lei 10.639/03.

Seguindo a tradição iniciada por seus pais, ele organiza dois grandes eventos em espaços públicos de Belo Horizonte, ligados às tradições afro brasileiras: a Festa de Iemanjá, que ocorre em agosto na Lagoa da Pampulha, e a Noite da Libertação, evento que celebra a abolição da escravatura, privilegiando a agência da ancestralidade afrobrasileira, especialmente dos Pretos Velhos, na luta histórica pela liberdade e dignidade do povo negro. O objetivo destas atividades é estimular o reconhecimento das tradições afro brasileiras pela população da cidade, por meio de uma aproximação festiva, alegre e respeitosa, capaz de modificar a situação de forte racismo religioso vivido pelo povo negro de axé. Em 16 de outubro de 2019, essas duas festas foram reconhecidas oficialmente como patrimônio imaterial da cidade de Belo Horizonte.

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