A Vila Petrópolis, no Barreiro, se despediu do primeiro ciclo do Projeto Ocupa FavelArte – Cultura, Cidadania e Memória da Periferia com emoção, dança, música e gratidão. O ponto de cultura, surgido em 2023 a partir da luta por moradia, transformou a antiga ameaça de despejo em território de criação e pertencimento. Entre maio e outubro de 2025, o espaço acolheu sete oficinas gratuitas, reunindo mais de 200 crianças, jovens, idosos, pessoas com deficiência e moradores de diferentes regiões de Belo Horizonte, em um verdadeiro encontro de corpos, memórias e afetos.
A pessoa coordenadora do projeto, Sabrina Dourado, conta que começou com expectativas modestas. “Eu sinceramente achei que a população não ia aderir. Aqui a cultura é outra, a cultura das igrejas, das festas juninas é muito forte, mas um ponto de cultura, com tantas oficinas diferentes, nunca teve aqui, então eu achei que a gente ia ter dificuldade com o público, esse era meu maior medo”. O resultado, porém, superou qualquer previsão: “Eu fiquei até emocionada. Todas as oficinas tiveram público, e a de Raízes e Retalhos quase extrapolou, foram mais de 140 inscritos e conseguimos atender 120 pessoas, tivemos até que marcar um dia a mais com a oficineira”.
As oficinas de capoeira, teatro, contação de histórias, música, breakdance, palhaçaria e arte têxtil movimentaram o território e criaram uma rede afetiva entre oficineiros e participantes. Para registrar o processo, o grupo criou um Caderno de Memórias e um Mural de Rastros, que guardam fragmentos de palavras, desenhos e lembranças deixadas por quem viveu o projeto. “Quando você lê o caderno, você se emociona. Eu não pude estar em todas as oficinas, mas consegui acompanhar pelos registros. Deixou meu coração muito quentinho”, afirma Sabrina.
A produtora Maria, que acompanhou de perto todo o percurso, destaca o caráter coletivo e amoroso da iniciativa, que também teve parceria com o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) da região e com o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem). “Foi muito bonito ver tudo acontecer. Nenhum dia foi só um dia de oficina. Cada encontro era um espaço de compartilhar, de ouvir, e nada disso foi feito sozinho, foi um trabalho de parceria entre coordenação, oficineiros, comunidade e participantes”, afirma. Segundo ela, o território foi determinante para o sucesso da experiência, o FavelaArte abraçou a todos, e todos abraçaram o FavelaArte. As pessoas chegavam com o coração aberto, movidas pela curiosidade e pelo encantamento, o espaço acolheu desde grupos de idosos e jovens até pessoas com deficiência, criando um ambiente verdadeiramente diverso e afetivo.
Mesmo diante dos desafios, como a falta de recursos e os imprevistos da vida na periferia, o projeto conseguiu se manter com planejamento, parceria e afeto, “Teve dia que a água acabou, a luz também, mas a equipe entendia, acolhia, seguia firme. Essa compreensão é o que sustenta o trabalho na quebrada”, conta Sabrina.
O encerramento do projeto, com apresentações de breakdance e música, foi marcado por emoção e celebração. Entre lágrimas e abraços, equipe e participantes revisitaram lembranças no Caderno de Memórias, símbolo do vínculo criado ao longo dos meses, e Sabrina conta que ver as pessoas pedindo a continuidade das oficinas foi o melhor resultado possível, um sinal de que o projeto tocou o território de forma profunda.
Para o futuro, o desejo é seguir. “Há planos para um segundo ciclo de oficinas, mas tudo depende da aprovação de novos projetos. A vida do artista é de risco, se tem projeto, a gente trabalha; se não tem, a gente dá um jeito. Mesmo assim, eu sigo tentando, escrevendo, acreditando”, finaliza Sabrina. Para a equipe, o encerramento não é um fim, e sim um recomeço, o Ocupa FavelArte precisa ter uma segunda etapa, porque a comunidade demonstrou um real desejo de permanência, foi um processo de trocas, afetos e transformações que não pode parar.
O Projeto “Ocupa FavelArte – Cultura, Cidadania e Memória da Periferia” é realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte. Mais do que um conjunto de oficinas, ele se tornou um espaço de encontro, aprendizado e resistência, onde a arte reafirma o direito de existir com dignidade. Porque onde a cidade insiste em esquecer, o território lembra e resiste, criando.
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