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Por que o Brasil falha em solucionar crimes contra mulheres?

Tempo de leitura: 3 min

em 26/04/2025

Por que o Brasil falha em solucionar crimes contra mulheres?

A cada hora, nove mulheres foram estupradas no Brasil em 2024. Apesar de alto, o número é subdimensionado e o motivo é cruel: meninas e mulheres não se sentem protegidas para denunciar essas violências. Muitas temem ser desacreditadas e outras temem ser culpadas pela violência que sofreram. “Eu não denunciei porque seria a minha palavra contra a dele e iriam começar a me chamar de nomes, como se eu tivesse culpa pelo que aconteceu”, comenta a estudante V., que foi estuprada por um amigo quando estava alcoolizada. 

Mestre e professora de Direito Penal, a advogada criminalista Jacqueline Valles, conta que o caso de V. não é isolado. Ela própria já presenciou muitas mulheres serem desacreditadas ou ridicularizadas quando denunciaram um crime. “Há uma cultura machista muito forte no Brasil e isso é um dos fatores que explica a escalada da violência e a subnotificação de crimes graves. Infelizmente, em muitos casos, quem deve proteger essas vítimas não está preparado, e o resultado é terrível”, comenta. 

Segundo a jurista, que tem mais de 30 anos de experiência na Vara do Júri, além da conscientização e mudança social, a falta de peritos criminais contribui para que haja uma impunidade nos crimes contra as mulheres. “Todo crime deixa vestígios. Esta máxima da criminalística ressalta a importância da perícia criminal na elucidação de casos. Mas o que vemos, na prática, é uma escassez de equipes bem equipadas e em número suficiente, mesmo em estados como São Paulo. Isso tem comprometido significativamente a capacidade do sistema judicial de processar criminosos e proteger vítimas”, avalia Jacqueline.

A ciência não mente

A advogada criminalista sustenta que é imperativo que o Estado dê maior atenção às provas técnicas. A falta de investimento nessa área deixa vítimas desamparadas, mas também os alvos de eventuais falsas acusações. “Uma prova técnica, coletada, processada e analisada com base na ciência e tecnologia, é imparcial e seu impacto na justiça é imenso. Uma perícia forte invalida qualquer tentativa de descredibilizar a vítima”, reforça. 

As provas técnicas têm o poder de corroborar versões e prevenir injustiças. Diferentemente de testemunhos, que podem ser influenciados por diversos fatores, as evidências científicas oferecem uma base objetiva para a tomada de decisões judiciais. “As provas técnicas dependem da natureza do crime cometido”, explica Valles. “Podem variar desde testes de DNA até provas digitais, gravações de voz ou transcrições de mensagens. A dinâmica específica do crime determina quais tipos de provas técnicas os peritos podem coletar e analisar.”

Desafios 

Nos casos de violência sexual, a perícia criminal enfrenta desafios particulares. “Não existe uma fórmula única para atribuir provas a esse tipo de crime. Em situações onde não há marcas físicas evidentes, é necessário analisar o contexto apresentado pela vítima e buscar evidências corroborativas, como testemunhos de vizinhos ou danos a propriedades. Além disso, é sempre válida a elaboração de perícias psicológicas que podem atestar o impacto da violência nas vítimas e a conduta de acusados”, comenta Jacqueline.

Necessidade de corroboração

Embora a palavra da vítima seja um elemento importante para a Justiça brasileira, Jacqueline esclarece que ela não deve ser o único fator para uma condenação. “A tendência judicial é acreditar na palavra da vítima inicialmente. No entanto, para garantir um processo justo, é crucial que haja provas técnicas que possam corroborar ou refutar as alegações. E isso é feito por meio de investigações e por meio de análise pericial da vítima, da cena do crime, do suspeito e de tudo o que esteja relacionado com o crime”, observa. 

A falta de investimento em perícia criminal no Brasil tem consequências graves. Muitos casos permanecem sem solução ou são anulados devido à insuficiência de provas técnicas. “Isso não apenas nega justiça às vítimas, mas também pode levar à condenação equivocada de inocentes. É urgente que o governo brasileiro priorize o investimento em Polícia Científica e perícia criminal. Mais que equipar e aumentar o número de equipes, é preciso investir em treinamento especializado em crimes de violência contra a mulher e na criação de protocolos específicos para coleta e análise de evidências em casos de violência sexual”, completa a jurista.

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