
A liberdade de expressão é um direito fundamental previsto na Constituição Federal brasileira. Ela assegura o livre pensamento, a crítica, o humor, a arte, a fé e a produção intelectual. No entanto, quando essa liberdade ultrapassa os limites do respeito à dignidade humana, pode se transformar em crime. É nesse ponto que o Direito Penal atua como instrumento de equilíbrio entre a liberdade individual e a proteção de direitos fundamentais.
Segundo o professor Esley Porto, do curso de Direito da Una Jataí, “a opinião se torna criminosa quando ultrapassa os limites do debate público e se transforma em ofensa, discriminação ou incitação à violência. O que define essa fronteira é o conteúdo, o contexto e o impacto causado, principalmente sobre grupos vulneráveis”.
Crimes e punições
A legislação brasileira é clara ao coibir práticas que ferem a honra, a reputação e a integridade de indivíduos ou coletividades. Crimes como calúnia (acusar falsamente alguém de um crime), difamação (atribuir fato ofensivo à reputação) e injúria (ofensa direta à dignidade) estão previstos nos artigos 138 a 140 do Código Penal.
Porto explica que “o discurso de ódio é aquele que incentiva ou legitima a violência, a exclusão ou a inferiorização de pessoas ou grupos com base em características identitárias”. Entre os crimes associados a esse tipo de conduta estão: racismo (art. 20 da Lei 7.716/89); LGBTfobia, equiparada ao crime de racismo após decisão do STF; xenofobia, também prevista na mesma lei; misoginia e sexismo, que podem ser enquadrados como injúria ou difamação; e intolerância religiosa, que pode configurar crime tanto pela Lei de Racismo quanto por injúria. “O STF já declarou que a liberdade de expressão não protege o discurso de ódio, sobretudo quando ele atinge os direitos de minorias”, destaca.
As penas variam conforme o tipo de crime. “Calúnia e difamação preveem penas de seis meses a dois anos e de três meses a um ano de detenção, respectivamente, além de multa. A injúria pode gerar detenção de um a seis meses, sendo agravada para até três anos em casos de injúria racial. Já os crimes de racismo, conforme a Lei 7.716/89, podem levar a reclusão de até cinco anos ou mais, dependendo da gravidade. Outras infrações, como ameaça e apologia ao crime, também são punidas com detenção ou multa”, detalha o professor.
Importante destacar que, enquanto crimes como calúnia e difamação exigem queixa da vítima, os que envolvem preconceito racial ou de minorias são de ação penal pública, ou seja, o Estado tem o dever de investigar e processar independentemente da vontade da vítima.
Nas redes
A disseminação desses discursos nas redes sociais potencializa o alcance e a gravidade do crime. Quando uma postagem ofensiva se torna viral, os danos são amplificados e a responsabilização também pode se estender a quem compartilha, não apenas a quem publicou. “A internet não é um território sem lei. O uso de meios digitais que ampliam a exposição da vítima pode ser considerado agravante. Além disso, quem compartilha conteúdo ofensivo também pode ser responsabilizado civil e criminalmente”, alerta Porto.
Para quem sofre um ataque virtual ou discurso discriminatório, o professor orienta: “É fundamental reunir provas, como prints, links e registros de IP, registrar boletim de ocorrência — preferencialmente em delegacias especializadas — e procurar o Ministério Público, Defensoria Pública ou até mesmo ONGs de direitos humanos”.
Educar também é proteger
Mais do que punir, o Direito também tem papel educativo. “A educação jurídica deve ensinar o equilíbrio entre direitos, o respeito à diversidade e a resolução de conflitos sem violência. O Direito Penal precisa ser usado com responsabilidade, voltado à prevenção e à proteção de bens jurídicos essenciais”, conclui Porto.